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Póvoa de Varzim, Porto, Portugal
Num volte-face, quando eu puder, viro menina-mulher.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

   A verdade é que agora te posso amar. Já não falas mais alto. Já não me ensurdeces, já não me empurras, já não me empilhas a um canto.  Agora arriba a paz. Fazes as tuas guerras, lá, do outro lado de ti. Porque se os teus dias são cinzentos, os meus são verde-água. Cheios do amor que me sobrou. Não sei de ti e dói, e não tenho posição. Porém, a inquietude é, em prova forte, que me sinto amar, que me sinto sentir. Exuberância. A sombra nunca me chegou, nem o silêncio. E já amputei orgulhos a fim de preparar a terra. O amor é um fruto arisco que não cresce assim com duas tretas. Mais a mais, tu és demasiado rabugento para agricultor. Nunca estás quieto o suficiente para ver florescer, que é a parte mais bonita. Percebo muito mais de amor que do resto. Do resto não entendo nada, tens razão. 
 
    E vou sendo feliz, se tu estiveres feliz também. 
    Prometi os meus dias à tarefa de te fazer acreditar, mas isso agora já não me interessa. 
   Amo-te. Amo-te sozinha, que assim é que é de amar.
   

quinta-feira, 2 de junho de 2011

A cambada

   A cambada fez o que quis com o q'eu lhe dei. Espesinhou-me o coração. Queimou-me os olhos. Esgravatou-me o peito até sair o podre e ficar o novo. O podre. A cambada pensa amor-podre. Deu-me em ódio e raiva novidades de prudência e mágoa. Violou-me a criança, esfolou-ma de dentro para fora. Desgraçou-me a família que não vou chegar a ter. Fez-me do praguejo prece, sem me obrigar, o que ainda sangrou mais. Lanhou-me a boca. Cortou-me os dedos um a um, duas mãos cheias de vezes. Pregou-me os pés ao chão. Depois arrancou-os sem aviso. Gravou ferros nas minhas coxas, fiquei marcada de ninguém. Espetou-me de estoque, punhal, adaga e espada... Esfarrapou-me a língua para não me queixar. 
   Mas a cambada é minha. A cambada nunca me abandona. Criatura fiel. Nunca desaparece. Não vai embora. Participação activa dos meus medos, das minhas vontades, das vontades dos outros em mim, dos medos dos outros sobre mim.  Me dobra, me quebra, me rompe. Dobro-me, quebro-me, rompo-me! Sou eu a Cambada. Eu e os outros que sou eu, afinal. Eu lhe fiz. Grosseira, tosca, rude, nojenta, má, mesquinha e egoísta. Fi-la da minha merda. E a minha merda persegue-me. Persegue-me, engrossa-se e ganha-me! A parte vence o todo. A parte, sozinha, garante um todo cobarde. Um todo no sofá, um todo apático. Morno e aliviado. Desertor duma luta que não consegue travar, porque já nem inteiro é.  
   Alvíssaras! A força chegará. A aceitação da verdade da cambada é o caminho. Fazer o todo inteiro, não a ignorando, não lhe fugindo. 
    A cambada são bichos que me vêm comendo o cérebro.