Era uma casa muito engraçada, não tinha tecto, não tinha nada.
Mas era lá que eu morava. Por escolha ou por briga, ainda não sei bem. Só sei que a casa só dava intriga e nos fez refém. O preconceito se fez de muro e da diferença um vidro escuro. E não se via, e não se via e era negra, sem luz do dia. E da janela sabia a pouco, nesse sufoco com cheiro a mofo. E eu só queria, que a casa fria, sentisse o quente, como eu sentia. A irritação veio só depois, quando na casa já não eram dois. Finados, os dois defuntos, morriam sempre, mas nunca juntos.
Ninguém podia entrar nela, não, porque a casa não tinha chão.
Ignorando esta condição, entrámos sim, já dada a mão. Mas ninguém vive sem tecto e chão, não há base nem sustentação. Eu refilei toda a santa hora, refilo ainda, refilo agora. Tu foste embora, eu não te censuro, a casa é velha, precisa aprumo. Não dá pr'a ter casa de amor, feita só com vontade; nem que sej'amor de verdade! Porque se há coisa que se sabe, se mais não, é que não se mente a vontade. Ela cumpre o coração.
Mas era feita com muito esmero, na rua dos bobos, número 0.
É isto que a vontade tem de bonito. Negar, à partida, o que já vem escrito.
PS- Eu também me mudava, em poder. Mas tenho tanta vontade investida que acho que vou ficar a balançar a rede nesta sem-parede, a ver o céu de estrelas cru, com o pé na lama. Há sempre dias e o tempo não deixa de vir.
dos textos mais bonitos que já li
ResponderEliminarDos textos mais bonitos que já li.
ResponderEliminar